AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA EM IDOSOS COM PERDA AUDITIVA
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Existem diversas pesquisas que investigaram a influência da perda auditiva em pacientes idosos, mas ainda há muito a ser desvendado. Estudos de ressonância magnética com o objetivo de identificar os fatores do envelhecimento mostraram que, em indivíduos saudáveis, ocorre uma perda anual do volume cerebral de 0,2% aos 35 anos de idade, ao passo que, aos 60 anos de idade. a perda alcança cerca de 0,5%. Interessantemente, foi averiguado que as alterações são mais evidentes nas seguintes regiões: lobo temporal, hipocampo e córtex pré-frontal. Não por coincidência, estas regiões estão envolvidas em habilidades vitais no processamento das informações auditivas, tais como memória visuoespacial episódica, associação de ideias, processo de aprendizagem, memória de trabalho, reconhecimento e discriminação sonora, memória de sons verbais e processos atencionais.
Diante da possibilidade de alterações em diferentes regiões cerebrais, sabe-se que existem diferentes padrões de prejuízos auditivos entre os idosos. Portanto, seria de extrema importância que as condições auditivas destes pacientes fossem minunciosamente documentadas, possibilitando a compreensão das peculiaridades desta população.
O processo de envelhecimento, frequentemente, está associado a problemas auditivos, seja na audibilidade dos sons, na percepção ou, ainda, seja na discriminação dos sons. Os prejuízos oriundos das questões auditivas, infelizmente, não se concentram apenas neste aspecto, existindo, repercussões mais importantes e profundas que podem ocasionar grande desconforto psicológico e funcional nestes idosos.
O rebaixamento auditivo é uma realidade na população idosa, entretanto, existe um aspecto preocupante associado a esta deficiência, o isolamento social. Diante das dificuldades no processo comunicativo, não é incomum que os idosos se sintam excluídos, ou mesmo tenham receio de estarem incomodando a dinâmica familiar com interrupções nas rodas de conversa. As reações de idosos com perda auditiva são inúmeras, entre elas: depressão, solidão, frustração, vergonha, culpa, ansiedade, confusão, dificuldade de atenção e foco, diminuição da autoestima e da independência, pensamentos ruins e depreciativos e prejuízos importantes no processo comunicativo.
Diante da diversidade de complicações decorrentes da perda auditiva nesta população, existe a necessidade de pensar além do processo de seleção e adaptação de aparelhos de amplificação sonora individual. É necessário atentar para as questões inerentes ao bem-estar.
Desta forma, aplicação de questionários de avaliação do estado de qualidade de vida (EQV) e bem-estar psicológico destes pacientes é recomendada. Alguns protocolos para analisar o EQV em idosos foram desenvolvidos e estão disponíveis para aplicação, análise e conduta. A unanimidade é de que estes protocolos devem ser multidimensionais englobando bem-estar físico, bem-estar material, bem-estar social e bem-estar emocional.
Abaixo, serão apresentados alguns dos instrumentos que poderão auxiliar no processo de análise do EQV nos idosos. Todos os questionários foram desenvolvidos com fácil nível de leitura, linguagem clara e direta e sem a exigências de muitas demandas cognitivas:
- O inventário de perda auditiva para idosos (IPAI): um instrumento validado e fidedigno, que permite a autoavaliação dos aspectos auditivos dentro da dinâmica emocional e social;
- O inventário de perda auditiva para adultos (IPAA): um instrumento derivado do IPAI, que permite a autoavaliação dos aspectos auditivos dentro da dinâmica emocional e sócio-situacional;
- O inventário internacional de resultados para aparelhos de amplificação sonora individual (IIR–AASI): análise de aspectos relacionados à utilização do AASI.
As respostas obtidas com os questionários acima permitem uma análise mais apurada das condições globais dos idosos e, portanto, poderão auxiliar no planejamento terapêutico identificando os malefícios da perda auditiva no dia-a-dia, bem como, o benefício da utilização do AASI, sendo relevante anotar que, em uma pesquisa realizada por Hyams e colaboradores com 100 idosos, foi averiguado que a qualidade de vida dos idosos é inversamente proporcional à presença de perda auditiva, assim, a perda auditiva parece ser um fator determinante na qualidade de vida e bem-estar. Portanto, a utilização do AASI parece melhorar significativamente a qualidade de vida dos pacientes idosos. E o EQV pode ser preditor e um instrumento de monitoramento das condições psicológicas e auditivas.
Em uma pesquisa longitudinal com cerca de 14.900 pacientes, apurou-se que a perda auditiva foi associada com o aumento de risco para o desenvolvimento da demência. No decorrer dos processos de entrevista e teste foi observada uma taxa mais rápida de declínio cognitivo nos pacientes com maiores prejuízos auditivos. Estes achados ratificam que a perda auditiva pode ser responsável por cerca de 9,1% do diagnóstico de demência ao redor do mundo. Sabe-se que a utilização do AASI ou IC poderia protelar, de modo significativo, o prejuízo cognitivo, a demência e a neurodegeneração global.
Consequentemente, O EQV deveria ser um instrumento valorizado dentro da rotina clínica dos profissionais que atuam com os indivíduos idosos, visto que, por exemplo, cerca de um terço dos pacientes diagnosticados com a Doença de Alzheimer ao redor do mundo poderia ter o diagnóstico postergado por meio do uso de algum tipo de dispositivo eletrônico. Posto isto, os EQV por serem de fácil aplicação poderiam ser utilizados tanto no processo de diagnóstico, quanto no monitoramento do tratamento de nossos idosos.
Referências consultadas:
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