FUNÇÕES COGNITIVAS E AUDITIVAS NO ENVELHECIMENTO
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BOLETIM NOVEMBRO
A relação entre a interação do Sistema Auditivo e as Funções Cognitivas estão em alta nos últimos anos. De acordo com Arlinger e colaboradores, o sistema auditivo é extremamente dinâmico e, intrinsicamente, relacionado às funções cognitivas.
No decorrer de nossas vidas ocorrem mudanças no funcionamento do sistema auditivo periférico que podem originar dificuldades em detectar, localizar e reconhecer os sons em ambientes acústicos e em situações de escuta cotidiana, especialmente, nos idosos. Aliás, exames com ressonância funcional evidenciaram que é comum uma diminuição do fluxo sanguíneo nas regiões corticais, tais como, região pré-frontal, córtex e lobo temporal no decorrer da idade. As alterações no fluxo sanguíneo contribuem para uma diminuição nos processamentos perceptuais e cognitivos.
Atualmente, existem muitos idosos preocupados em encontrarem métodos e estratégias que “posterguem” ou “reduzam” os efeitos do envelhecimento e já está bem estabelecido que um estilo de vida mais saudável (atividades físicas, sono de boa qualidade, alimentação saudável e atividades intelectuais) realmente podem auxiliar nesta caminhada.
A função cognitiva nos idosos é de extrema relevância, visto que, há a utilização de mecanismos compensatórios para preencher as possíveis lacunas em um processo comunicativo, como por exemplo, em decorrência da alteração das redundâncias intrínsecas e/ou extrínsecas, por meio da diminuição da audibilidade, do processamento sensorial lentificado, da redução da precisão espectrotemporal, do declínio cognitivo entre outros).
Quando se trata das habilidades intelectuais, pode-se dizer que os idosos que tiveram um maior empenho cognitivo, no decorrer de suas vidas, demonstraram melhores respostas nas habilidades de memória de trabalho de curto prazo, atenção auditiva, velocidade de processamento das informações auditivas, compreensão da mensagem falada e percepção de fala no ruído. Este processo pode ser denominado como habilidades cristalizadas, ou seja, são habilidades e memórias acumuladas, ao longo dos anos, que resultaram no processamento cognitivo oriundo do passado e trata-se, portanto, de um conhecimento adquirido. Uma maneira de se quantificar as habilidades cristalizadas é por meio de testes de conhecimento gerais que englobem a análise dos seguintes itens: (i) compreensão de leitura; (ii) vocabulário; (iii) raciocínio matemático; (iv) informações históricas; (v) ciências da natureza; (vi) habilidades visoespaciais; (vii) funções executivas entre outros. Acredita-se que, quanto antes ocorra a exposição a um ambiente rico em demandas cognitivas maiores serão os benefícios no futuro, em virtude que, as habilidades cristalizadas parecem ser aprimoradas até aproximadamente aos 60 anos de idade.
Os potenciais evocados auditivos relacionados a eventos (Potencial cognitivo P300 e/ou Mismatch Negativity) são instrumentos com grande possibilidade de avaliar e monitorar o efeito da idade no controle e processamento das informações auditivas e cognitivas. Há evidências neurofisiológicas de que o processamento é afetado pela idade e que a redução da percepção auditiva e cognitiva já pode ser percebida ao redor dos 50 anos de idade. Deste modo, seria extremamente benéfico a realização de uma bateria audiológica e atencional antes desta faixa etária, incluindo, a realização dos potenciais evocados auditivos de longa latência. Alguns estudiosos salientam que o uso combinado do potencial cognitivo P300 (que demanda atenção, foco e participação ativa do paciente) com o Mismatch Negativity (que não precisa da participação ativa do paciente) seria o indicado pois permitiriam observar em que, momento, o paciente apresenta maiores dificuldades em manter o foco e a atenção nas atividades auditivas. Além do que, associados as avaliações neuropsicológicas, os exames neurofisiológios poderiam auxiliar no diagnóstico diferencial de quadros de comprometimento cognitivo leve ou Alzheimer.
A relação entre audição e cognição é tão relevante que desenvolvedores de algoritmos de aparelhos auditivos começaram a considerar as análises das funções cognitivas na escolha do processamento dos aparelhos de amplificação sonora individual (AASI). Existindo uma recomendação de compressão de ação lenta para os indivíduos com habilidades cognitivas rebaixadas. Futuramente, o desempenho das habilidades cognitivas poderá ser um pré-requisito essencial na seleção e programação dos AASI?
Outras questões pairam sobre este tema, tais como, os pacientes com rebaixamento cognitivo e com alterações auditivas necessitam de um programa de habilidades cognitivas e atencionais previamente ao processo de reabilitação auditiva?
Concluindo, o tamanho do cérebro diminui com a idade, com a redução substancial das substâncias brancas e cinzentas. Os lobos temporais também apresentam uma diminuição do seu volume com o envelhecimento, assim sendo, tanto a percepção sensorial quanto a velocidade de processamento diminuem com a idade, impactando o desempenho cognitivo. A acuidade auditiva pode diminuir após os 30 anos de idade, sendo que, até 70% dos indivíduos com 80 anos de idade apresentarão um quadro de perda auditiva. Estas alterações trarão dificuldades como a localização sonora e a discriminação dos sons de fala associadas a um declínio na percepção sensorial. Deste modo, as habilidades cognitivas sofrerão também com as alterações decorrentes do sistema auditivo.
Enfim, estamos em um momento da Ciência em que às necessidades de cada paciente deve ser monitoradas cuidadosa e detalhadamente para que o atendimento seja personalizado, humanizado e realmente efetivo. Assim, a compreensão das relações entre cognição e audição devem ser claras para os profissionais envolvidos no processo comunicativo.
REFERÊNCIAS CONSULTADAS:
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