OTITE MÉDIA E COVID: QUAL A RELAÇÃO?
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BOLETIM março 2021
OTITE MÉDIA E COVID: QUAL A RELAÇÃO?
No final do ano de 2019, em Wuhan, na China, foi identificado o surto de uma nova doença provocada por um coronavírus inédito, o SARS-CoV-2. Intitulada COVID-19, essa afecção espalhou-se rapidamente pelo mundo e alcançou o status de pandemia em Março de 2020. A COVID-19 é caracterizada por apresentar um amplo espectro de sintomas, entre eles, os mais relatados são: febre, tosse, mialgia, fadiga e dispnéia. As queixas otorrinolaringológicas de anosmia (perda completa do olfato), hiposmia (redução parcial do olfato) e disgeusia (alteração no paladar) têm alta taxa de incidência e, por isso, foram incluídas, pela American Academy of Otolaryngology – Head and Neck Surgery (AAO-HNS), nos protocolos de rastreamento de pacientes suspeitos. Além disso, uma enfermidade que tem sido associada ao SARS-CoV-2 é a otite média (OM). Publicações recentes descrevem casos de pacientes com sintomas otológicos associados a achados radiológicos (alterações específicas na tomografia computadorizada de tórax) e/ou laboratoriais (teste de reação em cadeia da polimerase positiva de swab de nasofaringe/orofaringe) compatíveis com diagnóstico de COVID-19.
O SARS-CoV-2 utiliza a enzima conversora de angiotensina 2 (ECA-2), receptor tecidual, para ligar-se à célula-alvo e adentrar seu citoplasma. O elevado nível de expressão dessa proteína no epitélio respiratório é responsável pelo destacado tropismo do coronavírus pela mucosa das vias aéreas superiores. Por consequência, devido às especificidades anatômico-funcionais dessa região, a presença do SARS-CoV-2 na nasofaringe provocando disfunção tubária e/ou a possibilidade da sua disseminação, através da tuba auditiva, para orelha média podem favorecer o desenvolvimento da OM.
Relatos de casos recém publicados apontaram características epidemiológicas e clínicas que sugerem a associação entre OM e a COVID-19. Sabe-se que a OM apresenta maior incidência nas crianças, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 2/3 delas apresentam pelo menos um episódio de OM nos seus primeiros anos de vida, e nas estações frias do ano (outono e inverno) devido a relação com os quadros de infecções de vias aéreas superiores. Diferentemente, após o início da pandemia, foram observados casos em pacientes adultos, sem histórico de doenças do ouvido ou nasofaringe, com otite média e diagnóstico de infecção pelo SARS-CoV-2 durante os meses da primavera, inferindo possível influência do novo coronavírus na etiologia dessas infecções otológicas.
Em relação às manifestações otológicas descritas nos casos associados à COVID-19, otalgia, hipoacusia e plenitude aural foram as queixas mais frequentes. No exame otoscópico, observou-se, em regra, efusão na orelha média e/ou hiperemia da membrana timpânica com ou sem abaulamento. É importante ressaltar que, em alguns pacientes, a OM foi a primeira expressão do quadro de infecção COVID-19. Apesar disso, existem poucas citações sobre a detecção do novo coronavírus no fluido da orelha média. Infere-se que possa estar relacionado ao baixo refluxo passivo da nasofaringe, à baixa predileção do SARS-CoV-2 em invadir a mucosa da fenda timpânica e/ou à técnica inadequada de detecção.
Em virtude do limitado conhecimento sobre o potencial patogênico do SARS-Cov-2 no ouvido, tornam-se extremamente importantes as publicações que focam em estudos microbiológicos e no relato de casos de pacientes que apresentam diagnóstico de COVID-19 e sintomas otológicos associados. Entretanto, baseados nas evidências existentes, grupos de pesquisadores têm recomendado que, durante a situação de pandemia, a identificação de OM deva servir de alerta para a possibilidade de infecção pelo SARS-CoV-2.
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