TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA E AUDIÇÃO
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TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA E AUDIÇÃO
Os profissionais da área de saúde estão se deparando com um número crescente de pais que procuram por um atendimento e/ou uma avaliação para os filhos que apresentam suspeita de Transtorno do Espectro Autista (TEA).
O autismo é um distúrbio de desenvolvimento abrangente e complexo com diferentes possibilidades de sintomas e com diferenças no grau de comprometimento que variam de paciente para paciente. De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM 5) o autismo pode ser classificado como transtorno invasivo do desenvolvimento caracterizado por dificuldades de comunicação social interesses e comportamentos repetitivos e restritos.
O termo espectro passou a ser recomendado, visto que, embora exista um denominador comum, os sintomas e padrões podem ser amplamente diferenciados entre os pacientes. Importante salientar que os sintomas devem estar presentes no período inicial do desenvolvimento, em fase precoce da infância, mas podem ficar mais evidentes quando as demandas sociais e ambientais aumentam.
A suspeita do comprometimento auditivo decorre de dificuldades nos processos comunicativos e às consideradas “atipias” ou inconsistências nas respostas tanto a estímulos verbais quanto não verbais. Os responsáveis reportam prejuízos no desenvolvimento de linguagem associado a ausência ou diminuição de resposta à fala do interlocutor. Há ainda outros sintomas coexistentes, tais como: hipersensibilidade a estímulos sensoriais, agitação psicomotora ou apatia, dificuldade na coordenação motora, prejuízos de memória e controle atencional, bem como alterações no sono. Entretanto, dentre os prejuízos sensoriais, a modalidade auditiva parece ser a mais afetada e alguns pesquisadores sugerem que isso poderia estar relacionado a anormalidades evidenciadas na região do tronco encefálico, sistema límbico e amídgala em alguns dos indivíduos afetados.
É extremamente importante salientar que o TEA pode coexistir com perda auditiva. Um estudo com uma amostra clínica significativa de crianças com perda auditiva evidenciou que cerca de 5,3% eram portadores também de TEA. Além disso, frequentemente, os indivíduos com TEA apresentam queixas de hipersensibilidade auditiva ao som, dificuldade em ouvir em ambientes ruidosos, dificuldades em processar as informações auditivas e prejuízo em manter a atenção e foco aos diferentes tipos de som. Em decorrência destes aspectos, os audiologistas podem ser um dos primeiros profissionais a serem contatados em um processo diagnóstico de autismo.
A relação entre TEA e audição é tênue, mas em muitas crianças diagnosticadas com TEA houve suspeita de algum grau de comprometimento auditivo no início do desenvolvimento. Diversos estudos indicam que o autismo é diagnosticado tardiamente em crianças com perdas auditivas severas ou profundas e que o inverso também ocorre, ou seja, as perdas auditivas são diagnosticadas mais tardiamente em crianças com TEA. Desta forma, é de fundamental importância que os pacientes com suspeita de TEA sejam submetidos a uma avaliação audiológica o mais completa possível. A bateria de procedimentos audiológicos poderá auxiliar no diagnóstico diferencial, possibilitando a diferenciação entre: (a) perda auditiva exclusiva, (b) TEA exclusivo e (c) TEA e perda auditiva concomitantes. Existindo esta diferenciação entre os diferentes indivíduos, é possível delinear um programa de intervenção mais condizente e adequado para o quadro clínico individual.
As manifestações auditivas observadas em crianças com TEA podem responder bem a programas de reabilitação auditiva com o objetivo de reduzir e/ou eliminar as alterações auditivas; entretanto, a eficácia destes programas ainda está sendo pesquisada e validada. Para tanto, é extremamente importante que os fonoaudiólogos e audiologistas tenham conhecimento das etapas do desenvolvimento infantil para assegurar a identificação precoce e a distinção entre comportamentos inadequados, inesperados ou simples variações individuais em crianças com TEA.
Uma extensa pesquisa multicêntrica resultou num instrumento sobre os Indicadores de Risco para o Desenvolvimento Infantil (IRDI) (veja quadro abaixo). Este documento é composto por 31 indicadores clínicos de desenvolvimento referentes aos primeiros 18 meses de vida. Nesse protocolo, a ausência de dois ou mais elementos investigados pode ser um indicador de problemas no desenvolvimento ou de risco psíquico.
Quadro de Indicadores de Risco para o Desenvolvimento Infantil (IRDI)
Idade em meses | Indicadores |
0-4 meses incompletos |
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4-8 meses incompletos |
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8-12 meses incompletos |
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12-18 meses incompletos |
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Este quadro pode servir como um guia e/ou referência para uma análise preliminar da condição do paciente e, existindo, pontos relevantes dever-se-á pensar no encaminhamento para uma avaliação especializada e tratamento adequado. Cabe salientar que, dependendo do espectro, uma rede de profissionais será importante para o sucesso do processo de reabilitação. Desta forma, deve-se cogitar a necessidade de uma equipe interdisciplinar que inclua profissionais de diferentes áreas, como: pediatria, neurologia, otorrinolaringologia, audiologia, fonoaudiologia, psicologia, terapia ocupacional, fisioterapia e outros.
Em breve teremos outro boletim com outros aspectos do TEA. Fique ligado em nossos boletins!
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